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O medo como estratégia política.

O Ministro das Comunicações, Paulo Pimenta, diante do cenário publicação de diversos conteúdos críticos sobre a atuação do estado perante à tragédia no Rio Grande do Sul, não hesitou em solicitar ao Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que providências fossem tomadas com o fito de ” proteger a integridade e a eficácia das nossas instituições frente às tais crises”.

Segundo Pimenta, foram divulgados “conteúdos conspiratórios” e outros que dão conta da ineficiência do Estado. Traz a exemplo a publicação do perfil “Jornal Razão”, que apontou a ausência de ministros no Sul do país e criticou a ida da primeira-dama ao show da Madonna.

Paulo Pimenta segue com a lista dos críticos, sempre apontando o número de seguidores e de curtidas, incluindo o senador Eduardo Bolsonaro, que afirmou que o governo federal demorou quatro dias para ajudar a região.

No ofício do ministério das Comunicações, há uma tarja d’água em verde-amarelo escrito “liberdade” e a transcrição de postagens de outros perfis, como o de Leandro Ruschel, que iniciou seu texto com a declarão ” A crise brasileira é, acima de tudo, moral”.

O pedido final da autoridade máxima da comunicação pública no Brasil foi “solicito que providências cabíveis sejam tomadas por órgãos competentes desse Ministério, tanto para apuração dos ilícitos ou eventuais crimes relacionados à disseminação de desinformação e de individualização de condutas QUANTO PARA REFORÇAR A CREDIBILIDADE E A CAPACIDADE OPERACIONAL DAS NOSSAS INSTITUIÇÕES EM TEMPOS DE CRISE”.

Coincidentemente, o ofício que pede a repressão do Ministério da Justiça foi expedido no mesmo dia em que foi publicada a pesquisa mostrando que a maioria dos brasileiros hoje tem medo de expressar suas opiniões.

A conclusão é da Paraná Pesquisa, em levantamento realizado em todo o território nacional, evidenciando um maior medo no Sudeste. Dos entrevistados na região, 65,2% possuem receio de ser punido por falar ou escrever o que pensa. No sul, a taxa é de 62,6%, já no Nordeste, 54,8%. Destaque-se que nordestinos são os menos temerosos no país.

O receio de ser punido por divulgar suas opiniões também é maior entre os de ensino superior do que os de ensino fundamental (62,2% – 60,2%) e entre os evangélicos que os católicos (64,5% – 61,0%).

Toda essa sensação de medo tem razões claras para existir. O Brasil atravessa hoje, um cenário em que o estado utiliza-se de todo seu instrumental para perseguir e calar as vozes daqueles que parecem opositores ao governo. Nos EUA, este fenômeno é denominado de armamento do governo federal e já vem sendo enfrentado.

A concertação entre os Poderes é evidente, sobretudo a do Judiciário com o Executivo. Para isso, foram ignoradas garantias constitucionais básicas como da presunção de inocência, do duplo grau de jurisdição, da ampla defesa e a do juiz natural.

A inércia e isenção do Poder Judiciário não existem mais. Ministros são agentes políticos que expressam posicionamentos ideológicos sem qualquer constrangimento. O presidente do STF, por exemplo, exaltou “nós vencemos o bolsonarismo!”.

Há, também, dois inquéritos vigentes abertos, por iniciativa do próprio Supremo, para investigar supostas organizações e pessoas que atentam contra o “estado democrático de Direito”.

Um deles – o das “milícias digitais” foi criado em julho de 2021 (após o arquivamento do inquérito dos atos anti-democráticos) e teve nova prorrogação em março deste ano. O outro, aberto em 2019, já ganhou o apelido de “inquérito do fim do mundo” e tem por finalidade investigar as chamadas “fake news”.

Na prática, qualquer pessoa pode ser incluída, a qualquer momento, em algum deles. Este foi o caso de Elon Musk, o CEO do X (ex Twitter), que divulgou pedidos exarados pelo STF que atentam contra a legislação brasileira de proteção de dados.

 A questão ganhou repercussão internacional e foi objeto de audiência pública no Congresso americano ontem. Obviamente, a grande mídia, consorciada pelo recebimento de generosas verbas estatais, pouco falou sobre o tema.

O medo é um sentimento interessante. Aquele que o carrega tende a aceitar ordens desarrazoadas. Tende a provocar um comportamento de inércia. Nesse sentido, em princípio, a estratégia de implantar o medo parece funcionar, sobretudo em um país de ignorantes, que demoram a perceber a gravidade do estado das coisas.

Há, no entanto, efeito mediato e inevitável. Quem teme por muito tempo cansa de temer. O sentimento que, em princípio, deprime, provoca, no médio prazo, descontentamento. No longo prazo, no entanto, tem-se uma revolta inevitável, sendo esse, o combustível para qualquer queda.

As pesquisas de popularidade do Presidente Lula já evidenciam o esgotamento dessa estratégia do medo, na medida em que os perseguidos passam a ser vistos como corajosos combatentes. Há também uma multiplicação deles e o aumento do seu alcance, tornando o trabalho da censura do governo ineficiente e custosa. É tiro no pé.

O povo pode até ser ignorante. Mas já não é mais tolerante. Bem-vindos a era da informação pulverizada. A implantação do Ministério da Verdade restará fracassada.


Brasília, 8 de maio de 2024.

Júlia Lucy.

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